Porto, a cidade que tem dificuldade em dormir

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De dia como de noite (ver mapa em baixo), a VCI é uma das zonas com níveis elevados de ruído na cidade Fernando Veludo

Mapa municipal de ruído deixa evidente que uma parte considerável da cidade está exposta, durante a noite, a poluição sonora acima do aconselhável.

As noites da cidade têm estado mais animadas desde que os Clérigos foram redescobertos, mas o Porto não é Nova Iorque, a cidade que nunca dorme. Porém, a avaliar pelos mapas estratégicos de ruído, uma parte muito significativa da cidade está, durante a noite, exposta a valores de poluição sonora que excedem os 45 decibéis. As consequências, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), vão da dificuldade em conciliar o sono à provável interrupção do descanso, com todas as consequências que daí podem advir.

Este é um dos dados mais significativos que podem ser inferidos a partir dos documentos esta semana aprovados pelo executivo da Câmara do Porto, os quais também mostram que os principais causadores do ruído urbano portuense são as vias de circulação automóvel, nomeadamente a Via de Cintura Interna, a Estrada de Circunvalação e os acessos às várias auto-estradas que irradiam a partir do Porto. A isto acresce o facto de as principais áreas classificadas como zonas sensíveis (unidades de saúde, escolas e parques) estarem situadas nas imediações das ruas e estradas mais ruidosas.

Os mapas estratégicos de ruído, elaborados pelo Laboratório de Acústica do Instituto da Construção da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), têm como horizonte de validade o ano de 2013 e deverão dar origem, até ao final deste ano, a um Plano Municipal de Redução de Ruído (que, segundo a legislação em vigor, devia estar pronto há cerca um ano). No âmbito destes planos, poderão ser aconselhadas medidas de minimização de ruído que vão desde a instalação de janelas de vidro duplo à substituição do piso dos arruamentos.

Olhando para os mapas, facilmente se conclui que, durante o período diurno, as zonas mais próximas dos principais eixos rodoviários estão expostos a volumes de ruído que, sem a protecção de paredes e vidros, são passíveis de provocar forte incómodo, perda de audição a curto e longo prazo, problemas relacionados com o stress e mesmo a ocorrência de acidentes laborais e de circulação. Em certos casos, e tendo em conta a existência de várias escolas nas imediações, por exemplo, da VCI, onde são obtidos valores acima dos 70 decibéis, as consequências podem ser duradouras: uma criança submetida a elevados níveis de ruído durante a idade escolar, dizem os especialistas, não só aprende a ler com maior dificuldade como também tende a alcançar patamares inferiores no domínio da leitura.

Mapas em consulta pública

Apesar das barreiras acústicas instaladas na VCI, as zonas para lá dessa protecção registam ainda volumes de ruído bastante elevados durante o período diurno, por vezes acima dos 70 decibéis. Valores desta ordem foram igualmente registados em zonas consideradas "sensíveis" à luz da legislação de 2007, as quais, em alguns casos, não deviam estar expostas a níveis de poluição sonora acima dos 45 decibéis.

As zonas sensíveis, refira-se, devem ser consideradas prioritárias pelo Plano Municipal de Redução de Ruído. No caso do Porto, algumas dessas estruturas (como os equipamentos de saúde e universitários em torno do Hospital de São João) situam-se precisamente nas imediações de grandes vias de circulação. Equipamentos como o Jardim Botânico, o Parque da Cidade e vários bairros sociais estão também junto dos principais eixos viários. Durante a noite, as vias rodoviárias são mesmo o principal problema (ver mapa ao lado), já que a maior parte da cidade está exposta a valores acima dos 30 decibéis, a partir dos quais a OMS considera que se começam a sentir efeitos como a dificuldade em conciliar o sono e a perda de qualidade do descanso. A diminuição da qualidade do sono, refira-se, pode provocar aumento da pressão arterial e do ritmo cardíaco.

A elaboração do Plano Municipal de Redução de Ruído deverá passar assim por uma identificação rigorosa das zonas sobreexpostas à poluição sonora e das suas causas, definindo acções de redução dessa exposição. Os mapas já aprovados vão, entretanto, ser colocados em consulta pública, sendo uma ferramenta útil também em processos de operação urbanística.

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